26/02/2016 08:40:00 - Atualizado em 26/02/2016 11:32:00

Pichadora espalha provocações poéticas em muros de Curitiba

Sara Oliveira, Redação/RedeTV!
Giovanna Lima, a G.L, das paredes de Curitiba (Foto: Leonardo Schenato Barroso/Arquivo pessoal)
A primeira vez que a estudante de Letras Giovanna Lima, de 28 anos, pichou nos muros de Curitiba (PR) foi "vandalismo é não falar de amor". Com essa máxima, ela já define que, apesar da sua poesia em forma de pichação - que não pede licença nem autorização para ser tatuada em muros de locais abandonados, orelhões, postes - ser considerada crime, pior seria não fazê-la.

As frases de amor, existência, tempo, feminismo e até mesmo sobre bebida não instigam reflexão somente em quem passa pelos bairros Água Verde, São Francisco, Cabral, Batel e no centro da capital paranaense. As mensagens poéticas provocam questionamentos e identificação nas redes sociais, principalmente no Facebook, que reúne mais de 100 fotos de frases que se abrigam pela cidade. Até agora, a página conta com mais de 13 mil seguidores, e a cada foto de uma nova pichação, alguém se identifica, completa a poesia. 
Foto: reprodução/Facebook 
Em entrevista ao portal da RedeTV!, a estudante, que já é formada em Jornalismo, diz que se considera feminista e que, na sua poesia de muro, retrata experiências próprias que poderiam representar a vida de qualquer mulher, por isso a identificação. 
"Sou feminista e alguns versos servem como empoderamento pra mim - e muitas vezes consigo causar essa identificação em outras minas", explica ela. "Ao longo da vida, as mulheres passam por situações de violência, assédio, abuso e silenciamento muito parecidas. Tento mostrar, por meio de palavras, que elas não estão sozinhas e tento também incentivar a voz delas a reverberar. Conseguir trazer força e poder pras mulheres é um dos sentimentos mais maravilhosos que já senti", acrescenta.

Fã de Leminski, Walt Whitman, Roberto Piva e vários outros escritores e escritoras, brasileiros e estrangeiros, Giovanna diz que muitas vezes se vê citando alguma pichação, cujo autor desconhece. "Minhas maiores referências na escrita no muro são os anônimos".

Ela já teve várias frases apagadas, pelas pessoas e pelo tempo, mas ela continua a reinvindicar seu espaço. Afinal, para ela, se a publicidade pôde invadir avenidas, relógios, calçadas, praças, bancas de revista, pontos de ônibus e placas de rua, por que o povo não poderia? "Se ela pode estar em todo lugar é sinal que o povo também tem direito de ter um espacinho, né?", questiona.
Foto: reprodução/Facebook 
Se a poesia é chamada de crime, a menina que explodiu tingindo paredes se lembra da transformação que a cidade vive, principalmente, a cada dois anos. "Em vários lugares que escrevo, vejo vestígios de propaganda política. As paredes são tomadas por pinturas e letreiros. Eu tenho certeza que os políticos não pedem autorização pra escrever em muros abandonados.  Por que eu deveria ser punida e eles não?", compara.

A pichadora conta que seu processo de criação leva um tempo, para que a mensagem, apesar de curta, seja certeira. "Fico digerindo a ideia e tento transformar em palavras que consigam transmiti-la", explica. "Escrevo antes no papel, às vezes no quadro que tenho no meu quarto". 
Foto: reprodução/Facebook
Brincando com a metalinguagem quando vai às ruas, ela muitas vezes encaixa frase e contexto. "Procuro espaços que harmonizem com a escrita. Sempre que possível, tento encontrar um lugar que combine com as palavras, gosto dessa harmonia de local e conteúdo", justifica.

Giovanna acredita que a escrita na parede seja uma forma de gritar "a favor do amor, do feminismo, da luta contra o conservadorismo" e que o reconhecimento deve sair pelas portas de museus, galerias e bibliotecas para dar sua 'bênção' ao que está na rua. "Existe um outro lado - bonito, questionador, impactante  - que não está nesses espaços reservados para a arte", explica. "Tá cheio de gente produzindo muita coisa boa, mas a academia continua valorizando o de sempre. Os professores continuam indicando os mesmos livros pra leitura. Comprar um livro ainda é muito caro. Ir em uma exposição também. Algumas pessoas não têm condições pra isso. Na rua, é tudo de graça".

Mesmo sendo apagada e considerada um 'crime ambulante', Giovanna recusa a deixar as ruas algum dia. É ali que ela é lida, que gera identificação, que empodera, que deixa sua marca no mundo, que existe na assinatura G.L. Para ela, a poesia seria um lugar mais interessante se cada adulto resgatasse a criança que escrevia e desenhava na parede.

Se tivesse que abandonar o pincel, o lado de fora da casa, também rabiscada, continuaria sendo sua maior folha por uma boa causa: "A poesia é nobre demais para ficar longe da rua".
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook
Foto: reprodução/Facebook

Recomendado para você

Comentários