Jovem transgênero tem fotos e dados vazados após se alistar no exército em SP
Sara Oliveira/RedeTV!Imagens de Marianna e seus dados pessoas circulam na internet (Foto: Reprodução) |
A jovem transgênero Marianna Lively, que completou 18 anos neste domingo (27), alega estar sendo perseguida após ter fotos e dados pessoais divulgados na internet depois de ter se apresentado ao quartel do 4° Batalhão de Infantaria Leve, em Quitaúna, na cidade Osasco (Grande São Paulo).
Na última quarta-feira (23), Marianna foi fazer o alistamento militar obrigatório. A jovem conta que foi tratada de forma respeitosa e que o processo correu bem, mas na tarde do mesmo dia começou a receber ligações de desconhecidos, de vários Estados do país. Ela relatou o caso em seu perfil no Facebook. A publicação teve, até agora, mais de 5 mil compartilhamentos.
"Esses desconhecidos que estavam ligando, caçoavam de mim por eu ser trans, já outros me diziam ter gostado de mim e queriam deixar telefone para eu entrar em contato. Mas até então eu não estava ciente de nada", conta ela na postagem.
Durante a noite, a jovem descobriu que fotos suas, tiradas enquanto participava do processo, e sua ficha de alistamento estavam circulando pelo WhatsApp e pelas redes sociais. Todos os seus dados estavam nas mãos de estranhos.
Na quinta-feira (24), Marianna voltou ao quartel e afirma ter ouvido do capitão que deveria deixar "as coisas se acalmarem e simplesmente trocar de telefone". De acordo com ela, ele ainda pediu desculpas e disse que o responsável pela "infantilidade" seria punido.
Sou Marianna (nome social) sou transgênera, tenho 17 anos. Fui me apresentar no quartel no dia 23/09/2015 como meu dever...
Posted by Marianna Lively on Sunday, September 27, 2015
Punição
O Centro de Comunicação Social do Exército Brasileiro informou, em nota enviada ao portal da RedeTV! nesta terça-feira (29), que está sabendo do caso e já tomou as "medidas administrativas necessárias para o esclarecimento do ocorrido e os envolvidos serão responsabilizados por suas ações, dentro do que prescreve a legislação vigente".
O Exército Brasileiro ainda afirmou que "não discrimina qualquer pessoa, em razão da raça, credo, orientação sexual ou outro parâmetro e que não compactua com este tipo de procedimento e empenha-se, rigorosamente, para que eventuais desvios de conduta, sejam corrigidos, dentro dos limites da lei" (veja a íntegra abaixo)
Reação
Em conversa com o portal da RedeTV!, Patricia Gorisch, advogada de Marianna, afirma que a denúncia já foi enviada à Secretaria Nacional de Direitos Humanos e garantiu que será aberto um boletim de ocorrência para a início do processo na Corregedoria do Exército Brasileiro.
Para Patricia, não há dúvidas de que as fotos tenham sido tiradas por alguém de dentro do quartel, já que civis não podem entrar no local com celular.
A advogada ainda explica que irá acionar a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pois Marianna ainda era menor de idade na ocasião. "É caso de infração administrativa e criminal também", esclarece ela.
Patricia destaca que a Constituição proíbe qualquer forma de discriminação e que há tratados de direitos humanos que protegem os LGBTI's. "Pessoas morrem por isso a cada 26 horas no país. Sou pesquisadora de Direitos Humanos LGBTI e os dados são assustadores", afirma ela.
Medo e perseguição
Após a divulgação das fotos, Marianna vive com medo e afirma estar sendo perseguida. Ela está passando os dias fora da própria casa. "Tem pessoas indo no portão de casa atrás de mim. Estou sem privacidade nenhuma. Estou exposta", conta ela ao portal da RedeTV!.
Apesar do medo, ela diz que irá seguir com os processos, para evitar que casos como este se repitam. "Estou lutando para que a justiça seja feita. Para que outras trans não precisem passar por tudo isso ou algo pior. E não deixar abafar esse ato que ocorreu no quartel, pois tem acontecido isso há algum tempo já. Mas sempre abafam o caso e deixam de lado", afirma Marianna. "Só espero que a justiça seja feita e que não deixem esse caso de lado, pois a transfobia no Brasil só tem aumentado, se não tomarmos soluções, só vem a piorar"
Transfobia na internet
Responsáveis por comentários e postagens transfobicas podem ser punidos (Foto: Reprodução) |
Com a repercussão do caso, muitos comentários ofensivos estão sendo feitos na internet. Sobre isso, Patricia avisa que irá entrar na Justiça por danos morais e também devem pedir liminar para que as fotos sejam bloqueadas.
"Vamos entrar com medidas na Justiça Militar, com liminar na cível para tirar os posts, com danos morais, na criminal e no âmbito administrativo pela Secretaria da Justiça do Estado de acordo com a lei 10.948/01", informa a advogada.
Pessoas que fazem comentários de cunho racista, preconceituoso ou que incitam o ódio e a violência podem ser processadas e mesmo condenadas a prisão, segundo o Marco Civil da Internet, o Código Civil, a Constituição Federal, a Lei 10.948/01 e o Código Penal.
Nota do Exército Brasileiro enviada à RedeTV!
O Exército Brasileiro (EB) não discrimina qualquer pessoa, em razão da raça, credo, orientação sexual ou outro parâmetro. O respeito ao indivíduo e à dignidade da pessoa humana, em todos os níveis, é condição imprescindível ao bom relacionamento de seus integrantes com a sociedade.
O EB tem conhecimento do fato que envolveu a divulgação, sem autorização, das informações da pessoa em questão, durante o processo do Serviço Militar Obrigatório e já tomou as medidas administrativas necessárias para o esclarecimento do ocorrido e os envolvidos serão responsabilizados por suas ações, dentro do que prescreve a legislação vigente.
O Exército não compactua com este tipo de procedimento e empenha-se, rigorosamente, para que eventuais desvios de conduta, sejam corrigidos, dentro dos limites da lei.