Marielle Franco criticou Siciliano no plenário: "Minha palavra é de mulher, mas vale"
A vereadora Marielle Franco, morta em 14 de março, criticou o vereador Marcello Siciliano (PHS) durante plenário na Câmara dos Vereadores do Rio, em 17 de agosto do ano passado. Na terça-feira (8), Siciliano foi apontado por uma testemunha como um dos envolvidos no atentado, que também matou o motorista Anderson Pedro Gomes.
[leiamais] No vídeo, publicado pela página oficial da vereadora, Marielle aparece criticando o vereador por sua postura e declara: "E aí, Marcello, como eu tenho um bom diálogo com você, queria registrar só uma coisa na sua fala - para além da questão [...]: a minha palavra é a palavra de mulher, mas vale. Não é só palavra de homem que vale, não. E outra coisa: vale mais, inclusive, de que meia dúzia que desce aqui falando gracinha no elevador para assessoria com relação às questões do PL (projeto de lei) da visibilidade lésbica ontem. Então eu estou dispondo os microfones, claro que om a anuência da presidência, que cada um se inscreva para falar no microfone. Nem fazer piada no elevador e nem muito menos achar que a palavra que vai valer aqui é só a palavra de homem, porque a palavra de mulher vai valer aqui também".
Na legenda da publicação (veja abaixo), a vereadora ainda acrescentou: "Sextou com óclinhos! Em pleno 2017, tem gente na Câmara Municipal que ainda acha que palavra de homem é a que vale e gente que faz piada com lésbicas! Pega a visão!".
Denúncia e outro lado
Segundo informações obtidas pelo jornal O Globo, a testemunha, um ex-miliciano, detalhou quatro encontros entre o vereador e o miliciano Orlando Oliveira de Araújo, conhecido como Orlando de Curicica e preso desde outubro do ano passado (mas ainda liderando diversas favelas), que teriam começado a acontecer em junho do ano passado.
“Eu estava numa mesa, a uma distância de pouco mais de um metro dos dois. Eles estavam sentados numa mesa ao lado. O vereador falou alto: “Tem que ver a situação da Marielle. A mulher está me atrapalhando”. Depois, bateu forte com a mão na mesa e gritou: “Marielle, piranha do Freixo”. Depois, olhando para o ex-PM, disse: “Precisamos resolver isso logo”, contou a testemunha.
Com a acusação da testemunha, Siciliano realizou coletiva de imprensa, na manhã desta quarta-feira (9), para se defender. A jornalistas, ele disse que ter ficado surpreso com a alegação e que tinha uma boa relação com a vereadora.
"A minha relação com a Marielle era muito boa, não estou entendendo porque esse factoide foi criado contra a minha pessoa. Estou sendo massacrado nas redes sociais por algo que foi dito por uma pessoa que a gente não sabe nem a credibilidade que a pessoa tem. Nunca tivemos conflito político em região alguma. Ela esteve no meu aniversário".
Colaborador morto
Em abril, um colaborador do vereador foi encontrado morto em Taquara, em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio. Carlos Alexandre Pereira Maria, de 37 anos, foi morto a tiros. À época, o jornal Extra divulgou que testemunhas relataram que, antes de disparar, pistoleiros disseram que era preciso "calar a boca dele".
Após o crime, o gabinete do parlamentar divulgou nota lamentando a morte: "Foi com grande pesar que recebi a notícia de falecimento do nosso colaborador Carlos Alexandre Pereira. Durante o tempo em que esteve conosco ele fez tudo pela sua localidade e estava sempre disponível para ajudar no que fosse necessário. Eu me solidarizo com a dor dos familiares e amigos".
A morte ocorreu dias após o vereador prestar depoimento na investigação sobre a morte de Marielle e Anderson.
O caso
Marielle foi morta após participar um evento que reunia jovens negras, na Lapa, no centro do Rio, na noite de 14 de março. Ela estava com a assessora e o motorista do carro, Anderson Pedro Gomes, que também faleceu, quando o veículo foi emparelhado foi outro e alvejado por ao menos 13 tiros.
A vereadora foi atingida por quatro tiros na cabeça. Anderson, que era casado e tinha um filho pequeno, recebeu pelo menos três disparos nas costas. A assessora acabou atingida por estilhaços e não sofreu ferimentos mais graves.
A perícia apontou que todos os disparos foram efetuados por arma de calibre 9 mm e que a munição utilizada fazia parte de lotes vendidos para a Polícia Federal. Nove cápsulas foram encontradas no local.
A polícia trabalha com a suspeita de execução e acredita que o veículo foi perseguido por cerca de 4 km. As autoridades ainda apuram se um segundo carro teria participado dos assassinatos.
Marielle, de 38 anos, era uma conhecida ativista do movimento negro, defensora de minorias sociais e crítica da violência policial no Rio, além de ter sido a quinta vereadora mais votada nas eleições de 2016. Desde 28 de fevereiro, ela atuava como relatora de uma comissão da Câmara dos Vereadores criada para fiscalizar a intervenção federal no Rio.